quinta-feira, 23 de junho de 2011

O lado sub de Shakespeare

Soneto LVII

Sendo teu escravo, o que fazer senão atender
Às horas e aos chamados de teu desejo?
Não tenho tempo algum para mim,
Nem serviços a fazer, até que me peças.

Nem ouso repreender a hora do mundo sem fim,
Enquanto eu, minha soberana, sigo tuas horas,
Nem penso que a solidão da ausência seja amarga,
Após dispensar teu servo de teu serviço;

Nem ouso questionar com meus ciúmes
Onde andarás, ou imaginar o que fazes,
Mas, como um triste escravo, sento-me e não penso,

Salvo, onde estás e quão feliz fazes a todos:
Então, que tolo é o amor, que, sob teu jugo
(Embora nada faças), nenhum mal o assombre.


Soneto LVIII

Que Deus me perdoe, por me tornar teu escravo,
Que eu deva pensar em velar tuas horas de prazer,
Ou para ti contar os momentos de ansiedade,
Sendo teu vassalo disposto a estar à tua mercê.

Ó deixa-me sofrer, sob tua vista,
A ausência aprisionada de tua liberdade,
E domada pela paciência para sofrer a cada vez
Sem te acusar de me injuriares.

Estejas onde estiveres, teu jugo é tão forte,
Que podes privilegiar teu tempo
Para o que quiseres; a ti somente cabe

Perdoar-te por teus próprios crimes.
Devo esperar, embora esperar seja o inferno,
Sem culpar teu prazer, seja ele o mal ou o bem.
Willian Shakespeare, Sonetos (1609)